terça-feira, 31 de janeiro de 2012

“Bom Mestre, o que devo fazer para herdar a vida eterna?”

“Vai, vende tudo o que tens e dá o dinheiro aos necessitados e terás um tesouro no céu!”
 (Mc 10,21).


Vivemos em um mundo completamente conturbado. São várias as possibilidades de vida e a gama de fatores que podem influenciar nas nossas escolhas, nas nossas relações com as pessoas e com o mundo em geral, são várias as atividades que podemos fazer. Por um lado aparenta ser uma vida agitada, satisfatória e que de certa forma preencha o vazio que sentimos em nosso ser e que nos impulsiona a buscar novos horizontes, a fazer novas conquistas. Porém, essa realidade se apresenta também pelo seu verso. Com a variedade de opções, aumenta a possibilidade de erro nas escolhas gerando mais ilusões, fracassos e frustrações. Mas então, o que fazer perante tamanha variedade de opções e de ilusões que a vida nos oferece constantemente? Há dois mil anos, Cristo já dava esta resposta.

Vasculhando o Evangelho segundo São Marcos, vê-se um trecho bastante interessante e ao mesmo tempo inquietante. No capítulo décimo, do versículo 17 ao 22 (Mc 10, 17-22), deparamos com a passagem do jovem rico. À primeira vista pode parecer que a situação expressa neste texto não tem aplicabilidade em nossa vida, mas estudando e refletindo a fundo veremos que este jovem rico, através de sua pergunta, nos ensina e muito.

O jovem se dirige a Jesus e lhe pergunta: “Bom mestre, o que devo fazer para herdar a vida eterna?” Ora, era um jovem de fortunas. O dinheiro para quem o possui pode trazer momentos de alegria, prazer, amigos, status social; torna a vida de quem o possui muito mais agradável e confortável aqui neste mundo. Jesus mostra o caminho da prática dos mandamentos e preceitos que Deus havia dado a seu povo. O jovem, inquieto, diz que desde a sua juventude tem observado tais leis. O Cristo lhe diz que apenas uma coisa lhe falta para herdar o Reino do Céu: a venda de todos os seus bens e a entrega do dinheiro aos pobres e necessitados.

Para nós  que não possuímos uma grande quantia de riquezas e de bens podemos tomar tal fala de Jesus como um caminho para o encontro com a felicidade tão almejada por nós. Ao indicar para o jovem a venda de todos os seus bens, Cristo quer mostrar-nos a negligência a tudo aquilo que nos impede de ver e de sentir o que é verdadeiro, o que é eterno e real: a presença de Deus em nossa vida.

O dinheiro, assim como dito anteriormente, é fonte de ilusão, de penumbra e ofusca o verdadeiro e inquietante desejo do nosso coração de procurar por horizontes maiores, por algo maior que não nos decepcione, que seja fiel para conosco. Ao rompermos com todas as seduções, com todos os vícios materiais que mantém as nossas almas presas a este solo, poderemos alçar voo e buscar algo que verdadeiramente nos sustente e nos satisfaça.

Eis a resposta da pergunta inicial. Diante de tanta diversidade de opções e caminhos, devemos, pois, nos agarrar com afinco na rocha que é Cristo e não deixar com que bens passageiros nos inebriem e façam com que nos afastemos do nosso verdadeiro porto de chegada. Não é fácil falar de renúncia e abstinência em nossos dias atuais. Não é fácil entender essa mensagem, mas somente por este caminho desviaremos de todas as armadilhas do mundo, de todas as situações de pecado.

Não façamos como o jovem rico que ao ouvir tais palavras de Jesus ficou abatido e se retirou, mas que possamos com fé e coragem aceitar essa nova proposta de vida que Cristo oferece a nós como caminho e meta para a felicidade eterna.

Seminarista Lucas Alerson de Souza

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Ser cristão exige comprometimento


Diante dos apelos contínuos da contemporaneidade, somos levados a refletir de forma insistente sobre os valores que lançamos como verdades em nossa vida. Muitas são as formas de pensar e agir. Muitos são os caminhos oferecidos. Muitos são os valores vendidos pelos meios de comunicação. A todo o momento sofremos influências externas que podem provocar em nosso interior mudanças que não possuem um caráter de crescimento pessoal. Surge aqui, uma grande questão que irá nortear nossa reflexão: Estamos comprometidos integralmente com os ensinamentos de Jesus Cristo?
A Igreja não quer que deixemos de vivenciar a realidade que nos cerca, mas, orienta-nos a permanência do compromisso com os ideais do evangelho. Nossas escolhas devem ser embasadas nos valores transmitidos por ele. E isso, podemos confirmar através do valioso documento das Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil 2011-2015, que assim nos alerta:

“O discípulo missionário sabe que, para efetivamente anunciar o Evangelho, deve conhecer a realidade à sua volta e nela mergulhar com o olhar da fé, em atitude de discernimento. Como o Filho de Deus assumiu a condição humana, exceto o pecado, nascendo e vivendo em determinado povo e realidade histórica (cf. Lc 2,1-2), nós, como discípulos missionários, anunciamos os valores do Evangelho do Reino na realidade que nos cerca, à luz da Pessoa, da Vida e da Palavra de Jesus Cristo, Senhor e Salvador”. (DGAE 2011-2015, p. 25).


Ou seja, a proposta da Igreja não é somente o conhecimento da realidade, mas sim o anúncio do evangelho nesse novo tempo. O medo de assumirmos essa proposta faz-nos tornar pessoas não comprometidas com as virtudes do reino. Grandiosas mentes trabalham em função da não-crença. Muitos pensadores contemporâneos acreditam que a sociedade padece por possuir a fé. Mas, nós que acreditamos e que presenciamos a ação transformadora da Igreja, assumimos sem temor o trabalho vivificador da crença. Não por possuirmos uma arrogância mesquinha, mas, por estarmos conscientes da construção de um mundo melhor. Um mundo enraizado no amor e na fraternidade.
Sabemos que esses valores são de fundamental importância, mas, também sabemos que eles estão muitas das vezes na esfera da idealidade. Ou seja, não estão sendo vivenciados integralmente no que se refere à prática. A nossa missão é fazer com que esse projeto chegue cada vez mais perto da realidade. Pois, somente assim iremos chegar a tão sonhada proposta messiânica.
Mesmo sentindo os efeitos de um mundo secularizado não podemos deixar de elencar nossos valores, propor nossos caminhos e caminhar nas pegadas do Bom Pastor. A realidade que nos cerca está aí, em constante transformação. Mas, para que essa transformação esteja em consonância com nossos ideais devemos nos tornar membros ativos dela. Não como personagens repressores, mas, como educadores no amor. Em Jesus Cristo não há opressão e sim libertação. Que as luzes do evangelho possam guiar nosso povo rumo à Pátria Celeste. E que Maria, a fiel seguidora dos valores evangélicos, possa nos ajudar nessa empreitada. 

Seminarista Jorge Wilson Carvalho Fonseca

domingo, 1 de janeiro de 2012

DIA MUNDIAL DA PAZ

MENSAGEM DE SUA SANTIDADE
BENTO XVI PARA A CELEBRAÇÃO DO
XLV DIA MUNDIAL DA PAZ
1 DE JANEIRO DE 2012


EDUCAR OS JOVENS PARA A JUSTIÇA E A PAZ

1. O INÍCIO DE UM NOVO ANO, dom de Deus à humanidade, induz-me a desejar a todos, com grande confiança e estima, de modo especial que este tempo, que se abre diante de nós, fique marcado concretamente pela justiça e a paz.

Com qual atitude devemos olhar para o novo ano? No salmo 130, encontramos uma imagem muito bela. O salmista diz que o homem de fé aguarda pelo Senhor « mais do que a sentinela pela aurora » (v. 6), aguarda por Ele com firme esperança, porque sabe que trará luz, misericórdia, salvação. Esta expectativa nasce da experiência do povo eleito, que reconhece ter sido educado por Deus a olhar o mundo na sua verdade sem se deixar abater pelas tribulações. Convido-vos a olhar o ano de 2012 com esta atitude confiante. É verdade que, no ano que termina, cresceu o sentido de frustração por causa da crise que aflige a sociedade, o mundo do trabalho e a economia; uma crise cujas raízes são primariamente culturais e antropológicas. Quase parece que um manto de escuridão teria descido sobre o nosso tempo, impedindo de ver com clareza a luz do dia.

Mas, nesta escuridão, o coração do homem não cessa de aguardar pela aurora de que fala o salmista. Esta expectativa mostra-se particularmente viva e visível nos jovens; e é por isso que o meu pensamento se volta para eles, considerando o contributo que podem e devem oferecer à sociedade. Queria, pois, revestir a Mensagem para o XLV Dia Mundial da Paz duma perspectiva educativa: « Educar os jovens para a justiça e a paz », convencido de que eles podem, com o seu entusiasmo e idealismo, oferecer uma nova esperança ao mundo.

A minha Mensagem dirige-se também aos pais, às famílias, a todas as componentes educativas, formadoras, bem como aos responsáveis nos diversos âmbitos da vida religiosa, social, política, econômica, cultural e mediática. Prestar atenção ao mundo juvenil, saber escutá-lo e valorizá-lo para a construção dum futuro de justiça e de paz não é só uma oportunidade mas um dever primário de toda a sociedade.

Trata-se de comunicar aos jovens o apreço pelo valor positivo da vida, suscitando neles o desejo de consumá-la ao serviço do Bem. Esta é uma tarefa, na qual todos nós estamos, pessoalmente, comprometidos.

As preocupações manifestadas por muitos jovens nestes últimos tempos, em várias regiões do mundo, exprimem o desejo de poder olhar para o futuro com fundada esperança. Na hora atual, muitos são os aspectos que os trazem apreensivos: o desejo de receber uma formação que os prepare de maneira mais profunda para enfrentar a realidade, a dificuldade de formar uma família e encontrar um emprego estável, a capacidade efetiva de intervir no mundo da política, da cultura e da economia contribuindo para a construção duma sociedade de rosto mais humano e solidário.

É importante que estes fermentos e o idealismo que encerram encontrem a devida atenção em todos  os componentes da sociedade. A Igreja olha para os jovens com esperança, tem confiança neles e encoraja-os a procurarem a verdade, a defenderem o bem comum, a possuírem perspectivas abertas sobre o mundo e olhos capazes de ver « coisas novas » (Is 42, 9; 48, 6).

Os responsáveis da educação

2. A educação é a aventura mais fascinante e difícil da vida. Educar – na sua etimologia latina educere – significa conduzir para fora de si mesmo ao encontro da realidade, rumo a uma plenitude que faz crescer a pessoa. Este processo alimenta-se do encontro de duas liberdades: a do adulto e a do jovem. Isto exige a responsabilidade do discípulo, que deve estar disponível para se deixar guiar no conhecimento da realidade, e a do educador, que deve estar disposto a dar-se a si mesmo. Mas, para isso, não bastam meros dispensadores de regras e informações; são necessárias testemunhas autênticas, ou seja, testemunhas que saibam ver mais longe do que os outros, porque a sua vida abraça espaços mais amplos. A testemunha é alguém que vive, primeiro, o caminho que propõe.

E quais são os lugares onde amadurece uma verdadeira educação para a paz e a justiça? Antes de mais nada, a família, já que os pais são os primeiros educadores. A família é célula originária da sociedade. « É na família que os filhos aprendem os valores humanos e cristãos que permitem uma convivência construtiva e pacífica. É na família que aprendem a solidariedade entre as gerações, o respeito pelas regras, o perdão e o acolhimento do outro ». Esta é a primeira escola, onde se educa para a justiça e a paz.

Vivemos num mundo em que a família e até a própria vida se vêem constantemente ameaçadas e, não raro, destroçadas. Condições de trabalho frequentemente pouco compatíveis com as responsabilidades familiares, preocupações com o futuro, ritmos frenéticos de vida, emigração à procura dum adequado sustentamento se não mesmo da pura sobrevivência, acabam por tornar difícil a possibilidade de assegurar aos filhos um dos bens mais preciosos: a presença dos pais; uma presença, que permita compartilhar de forma cada vez mais profunda o caminho para se poder transmitir a experiência e as certezas adquiridas com os anos – o que só se torna viável com o tempo passado juntos. Queria aqui dizer aos pais para não desanimarem! Com o exemplo da sua vida, induzam os filhos a colocar a esperança antes de tudo em Deus, o único de quem surgem justiça e paz autênticas.

Quero dirigir-me também aos responsáveis das instituições com tarefas educativas: Velem, com grande sentido de responsabilidade, por que seja respeitada e valorizada em todas as circunstâncias a dignidade de cada pessoa. Tenham a peito que cada jovem possa descobrir a sua própria vocação, acompanhando-o para fazer frutificar os dons que o Senhor lhe concedeu. Assegurem às famílias que os seus filhos não terão um caminho formativo em contraste com a sua consciência e os seus princípios religiosos.

Possa cada ambiente educativo ser lugar de abertura ao transcendente e aos outros; lugar de diálogo, coesão e escuta, onde o jovem se sinta valorizado nas suas capacidades e riquezas interiores e aprenda a apreciar os irmãos. Possa ensinar a saborear a alegria que deriva de viver dia após dia a caridade e a compaixão para com o próximo e de participar ativamente na construção duma sociedade mais humana e fraterna.

Dirijo-me, depois, aos responsáveis políticos, pedindo-lhes que ajudem concretamente as famílias e as instituições educativas a exercerem o seu direito-dever de educar. Não deve jamais faltar um adequado apoio à maternidade e à paternidade. Atuem de modo que a ninguém seja negado o acesso à instrução e que as famílias possam escolher livremente as estruturas educativas consideradas mais idôneas para o bem dos seus filhos. Esforcem-se por favorecer a reunificação das famílias que estão separadas devido à necessidade de encontrar meios de subsistência. Proporcionem aos jovens uma imagem transparente da política, como verdadeiro serviço para o bem de todos.

Não posso deixar de fazer apelo ainda ao mundo dos media para que prestem a sua contribuição educativa. Na sociedade atual, os meios de comunicação de massa têm uma função particular: não só informam, mas também formam o espírito dos seus destinatários e, consequentemente, podem concorrer notavelmente para a educação dos jovens. É importante ter presente a ligação estreitíssima que existe entre educação e comunicação: de fato, a educação realiza-se por meio da comunicação, que influi positiva ou negativamente na formação da pessoa.

Também os jovens devem ter a coragem de começar, eles mesmos, a viver aquilo que pedem a quantos os rodeiam. Que tenham a força de fazer um uso bom e consciente da liberdade, pois cabe-lhes em tudo isto uma grande responsabilidade: são responsáveis pela sua própria educação e formação para a justiça e a paz.

Educar para a verdade e a liberdade

3. Santo Agostinho perguntava-se: « Quid enim fortius desiderat anima quam veritatem – que deseja o homem mais intensamente do que a verdade? ». O rosto humano duma sociedade depende muito da contribuição da educação para manter viva esta questão inevitável. De fato, a educação diz respeito à formação integral da pessoa, incluindo a dimensão moral e espiritual do seu ser, tendo em vista o seu fim último e o bem da sociedade a que pertence. Por isso, a fim de educar para a verdade, é preciso antes de mais nada saber que é a pessoa humana, conhecer a sua natureza. Olhando a realidade que o rodeava, o salmista pôs-se a pensar: « Quando contemplo os céus, obra das vossas mãos, a lua e as estrelas que Vós criastes: que é o homem para Vos lembrardes dele, o filho do homem para com ele Vos preocupardes? » (Sal 8, 4-5). Esta é a pergunta fundamental que nos devemos colocar: Que é o homem? O homem é um ser que traz no coração uma sede de infinito, uma sede de verdade – não uma verdade parcial, mas capaz de explicar o sentido da vida –, porque foi criado à imagem e semelhança de Deus. Assim, o fato de reconhecer com gratidão a vida como dom inestimável leva a descobrir a dignidade profunda e a inviolabilidade própria de cada pessoa. Por isso, a primeira educação consiste em aprender a reconhecer no homem a imagem do Criador e, consequentemente, a ter um profundo respeito por cada ser humano e ajudar os outros a realizarem uma vida conforme a esta sublime dignidade. É preciso não esquecer jamais que « o autêntico desenvolvimento do homem diz respeito unitariamente à totalidade da pessoa em todas as suas dimensões », incluindo a transcendente, e que não se pode sacrificar a pessoa para alcançar um bem particular, seja ele econômico ou social, individual ou coletivo.

Só na relação com Deus é que o homem compreende o significado da sua liberdade, sendo tarefa da educação formar para a liberdade autêntica. Esta não é a ausência de vínculos, nem o império do livre arbítrio; não é o absolutismo do eu. Quando o homem se crê um ser absoluto, que não depende de nada nem de ninguém e pode fazer tudo o que lhe apetece, acaba por contradizer a verdade do seu ser e perder a sua liberdade. De fato, o homem é precisamente o contrário: um ser relacional, que vive em relação com os outros e sobretudo com Deus. A liberdade autêntica não pode jamais ser alcançada, afastando-se d’Ele.

A liberdade é um valor precioso, mas delicado: pode ser mal entendida e usada mal. « Hoje um obstáculo particularmente insidioso à ação educativa é constituído pela presença maciça, na nossa sociedade e cultura, daquele relativismo que, nada reconhecendo como definitivo, deixa como última medida somente o próprio eu com os seus desejos e, sob a aparência da liberdade, torna-se para cada pessoa uma prisão, porque separa uns dos outros, reduzindo cada um a permanecer fechado dentro do próprio “eu”. Dentro de um horizonte relativista como este, não é possível, portanto, uma verdadeira educação: sem a luz da verdade, mais cedo ou mais tarde cada pessoa está, de fato, condenada a duvidar da bondade da sua própria vida e das relações que a constituem, da validez do seu compromisso para construir com os outros algo em comum ».

Por conseguinte o homem, para exercer a sua liberdade, deve superar o horizonte relativista e conhecer a verdade sobre si próprio e a verdade acerca do que é bem e do que é mal. No íntimo da consciência, o homem descobre uma lei que não se impôs a si mesmo, mas à qual deve obedecer e cuja voz o chama a amar e fazer o bem e a fugir do mal, a assumir a responsabilidade do bem cumprido e do mal praticado. Por isso o exercício da liberdade está intimamente ligado com a lei moral natural, que tem caráter universal, exprime a dignidade de cada pessoa, coloca a base dos seus direitos e deveres fundamentais e, consequentemente, da convivência justa e pacífica entre as pessoas.

Assim o reto uso da liberdade é um ponto central na promoção da justiça e da paz, que exigem a cada um o respeito por si próprio e pelo outro, mesmo possuindo um modo de ser e viver distante do meu. Desta atitude derivam os elementos sem os quais paz e justiça permanecem palavras desprovidas de conteúdo: a confiança recíproca, a capacidade de encetar um diálogo construtivo, a possibilidade do perdão, que muitas vezes se quereria obter mas sente-se dificuldade em conceder, a caridade mútua, a compaixão para com os mais frágeis, e também a prontidão ao sacrifício.

Educar para a justiça

4. No nosso mundo, onde o valor da pessoa, da sua dignidade e dos seus direitos, não obstante as proclamações de intentos, está seriamente ameaçado pela tendência generalizada de recorrer exclusivamente aos critérios da utilidade, do lucro e do ter, é importante não separar das suas raízes transcendentes o conceito de justiça. De fato, a justiça não é uma simples convenção humana, pois o que é justo determina-se originariamente não pela lei positiva, mas pela identidade profunda do ser humano. É a visão integral do homem que impede de cair numa concepção contratualista da justiça e permite abrir também para ela o horizonte da solidariedade e do amor.

Não podemos ignorar que certas correntes da cultura moderna, apoiadas em princípios econômicos racionalistas e individualistas, alienaram das suas raízes transcendentes o conceito de justiça, separando-o da caridade e da solidariedade. Ora « a “cidade do homem” não se move apenas por relações feitas de direitos e de deveres, mas antes e sobretudo por relações de gratuidade, misericórdia e comunhão. A caridade manifesta sempre, mesmo nas relações humanas, o amor de Deus; dá valor teologal e salvífico a todo o empenho de justiça no mundo ».

« Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados » (Mt 5, 6). Serão saciados, porque têm fome e sede de relações justas com Deus, consigo mesmo, com os seus irmãos e irmãs, com a criação inteira.

Educar para a paz

5. « A paz não é só ausência de guerra, nem se limita a assegurar o equilíbrio das forças adversas. A paz não é possível na terra sem a salvaguarda dos bens das pessoas, a livre comunicação entre os seres humanos, o respeito pela dignidade das pessoas e dos povos e a prática assídua da fraternidade ». A paz é fruto da justiça e efeito da caridade. É, antes de mais nada, dom de Deus. Nós, os cristãos, acreditamos que a nossa verdadeira paz é Cristo: n’Ele, na sua Cruz, Deus reconciliou consigo o mundo e destruiu as barreiras que nos separavam uns dos outros (cf. Ef 2, 14-18); n’Ele, há uma única família reconciliada no amor.

A paz, porém, não é apenas dom a ser recebido, mas obra a ser construída. Para sermos verdadeiramente artífices de paz, devemos educar-nos para a compaixão, a solidariedade, a colaboração, a fraternidade, ser ativos dentro da comunidade e solícitos em despertar as consciências para as questões nacionais e internacionais e para a importância de procurar adequadas modalidades de redistribuição da riqueza, de promoção do crescimento, de cooperação para o desenvolvimento e de resolução dos conflitos. « Felizes os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus » – diz Jesus no sermão da montanha (Mt 5, 9).

A paz para todos nasce da justiça de cada um, e ninguém pode subtrair-se a este compromisso essencial de promover a justiça segundo as respectivas competências e responsabilidades. De forma particular convido os jovens, que conservam viva a tensão pelos ideais, a procurarem com paciência e tenacidade a justiça e a paz e a cultivarem o gosto pelo que é justo e verdadeiro, mesmo quando isso lhes possa exigir sacrifícios e obrigue a caminhar contracorrente.

Levantar os olhos para Deus

6. Perante o árduo desafio de percorrer os caminhos da justiça e da paz, podemos ser tentados a interrogar-nos como o salmista: « Levanto os olhos para os montes, de onde me virá o auxílio? » (Sal 121, 1).
A todos, particularmente aos jovens, quero bradar: « Não são as ideologias que salvam o mundo, mas unicamente o voltar-se para o Deus vivo, que é o nosso criador, o garante da nossa liberdade, o garante do que é deveras bom e verdadeiro (…), o voltar-se sem reservas para Deus, que é a medida do que é justo e, ao mesmo tempo, é o amor eterno. E que mais nos poderia salvar senão o amor? ». O amor rejubila com a verdade, é a força que torna capaz de comprometer-se pela verdade, pela justiça, pela paz, porque tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta (cf. 1 Cor 13, 1-13).

Queridos jovens, vós sois um dom precioso para a sociedade. Diante das dificuldades, não vos deixeis invadir pelo desânimo nem vos abandoneis a falsas soluções, que frequentemente se apresentam como o caminho mais fácil para superar os problemas. Não tenhais medo de vos empenhar, de enfrentar a fadiga e o sacrifício, de optar por caminhos que requerem fidelidade e constância, humildade e dedicação.
Vivei com confiança a vossa juventude e os anseios profundos que sentis de felicidade, verdade, beleza e amor verdadeiro. Vivei intensamente esta fase da vida, tão rica e cheia de entusiasmo.

Sabei que vós mesmos servis de exemplo e estímulo para os adultos, e tanto mais o sereis quanto mais vos esforçardes por superar as injustiças e a corrupção, quanto mais desejardes um futuro melhor e vos comprometerdes a construí-lo. Cientes das vossas potencialidades, nunca vos fecheis em vós próprios, mas trabalhai por um futuro mais luminoso para todos. Nunca vos sintais sozinhos! A Igreja confia em vós, acompanha-vos, encoraja-vos e deseja oferecer-vos o que tem de mais precioso: a possibilidade de levantar os olhos para Deus, de encontrar Jesus Cristo – Ele que é a justiça e a paz.

Ó vós todos, homens e mulheres, que tendes a peito a causa da paz! Esta não é um bem já alcançado mas uma meta, à qual todos e cada um deve aspirar. Olhemos, pois, o futuro com maior esperança, encorajemo-nos mutuamente ao longo do nosso caminho, trabalhemos para dar ao nosso mundo um rosto mais humano e fraterno e sintamo-nos unidos na responsabilidade que temos para com as jovens gerações, presentes e futuras, nomeadamente quanto à sua educação para se tornarem pacíficas e pacificadoras! Apoiado em tal certeza, envio-vos estas reflexões que se fazem apelo: Unamos as nossas forças espirituais, morais e materiais, a fim de « educar os jovens para a justiça e a paz ».

Vaticano, 8 de Dezembro de 2011.

BENEDICTUS PP XVI

“Tota formosa et suávis es, pulchra ut luna, electa ut sol” – Toda sois formosa e doce, bela como a lua, eleita como o sol



Hoje, no horizonte da história de todos os povos despontou um novo ano: 2012. No primeiro dia deste ano que se caracteriza por ser o ápice da oitava de Natal, a liturgia nos faz invocar Maria Santíssima com o seu título mais antigo e sublime, o de Mãe de Deus.
            Ó que excelsa dignidade máxima! Ó que magnificência a Mãe abrigar em teu seio o Autor da vida que veio habitar em nosso meio! A antiga música já nos diz: “Quem terra, pontus, sídera Colunt, adorant, praedicant, Trinam regentem machinam, Claustrium Maria bajulat”. E nos fascina pela riqueza e pela beleza de suas palavras: “Aquele a quem adoram o Céu, a terra, o mar,o que governa o mundo, na Virgem vem morar”.
            O Cristo nasceu de Maria, o Filho do altíssimo Deus se fez homem para nossa redenção e a Virgem por sua dignidade tornou-se verdadeira Mãe de Deus. Na Divina Maternidade de Maria encontra-se também a maternidade de todos nós crentes e de toda a humanidade, pois após ter outorgado um corpo humano ao Filho de Deus, torna-se Mãe de todos os povos, porque por meio dela recebemos o autor da vida.
            “A Santíssima Virgem Maria, correspondeu fielmente a plenitude de graças ao qual foi enriquecida por Deus e excedeu em santidade todos os anjos e santos. Ela, é a puríssima Mãe do Redentor que com singular privilégio foi preservada de todo o pecado. É a Virgem gloriosa que pela excelsa dignidade de Mãe de Deus em corpo e alma e se encontra sentada a direita de seu divino Filho, como Rainha do Céu e da Terra”. E é exatamente sobre esses privilégios da Santíssima Virgem que o Papa Pio XII nos diz em sua Carta Encíclica Ad Caeli Reginam: Com razão acreditou sempre o povo fiel, já nos séculos passados, que a mulher, de quem nasceu o Filho do Altíssimo - o qual "reinará eternamente na casa de Jacó", (será) "Príncipe da Paz", "Rei dos Reis e Senhor dos senhores"-recebeu mais que todas as outras criaturas singulares privilégios de graça. E considerando que há estreita relação entre uma mãe e o seu filho, sem dificuldade reconheceu na Mãe de Deus a dignidade real sobre todas as coisas”.
            Meus estimados amigos que acompanham o nosso blog, há 44 anos celebramos, no primeiro dia do ano, o Dia Mundial da Paz. O primeiro dia do ano que a liturgia nos convida a voltarmos a nossa atenção para a maternidade de Maria é, o anúncio da paz, a presença da vida.
            O ano de 2012, que se inicia, será um ano abençoado, um ano de celebrações. Perfaz este ano meio século da criação do Seminário Diocesano São Tiago. Vamos colocar aos pés da Celeste Mãe do Redentor, durante todo o ano que hoje inicia, o nosso Seminário.
            Queremos também saudar a vocês, nossos benfeitores e amigos que aqui nos acompanham, com os votos de um feliz ano novo, cheio das bênçãos do céu, que a Mãe do Príncipe da paz conceda a todos o seu amparo celestial.

“Exaltata est sancta Dei Genitrix:
super choros Angelorum ad caelestia regna.”

Seminarista Plínio A. S. Almeida